--------------------------------------------------------------------------------------------------------
Trabalhei há alguns anos em uma grande empresa de Curitiba. Dessas que têm muitos funcionários, e entre eles figuras inacreditáveis. Como toda multinacional a rotina de trabalho era muito puxada. Nas longas horas que passei dentro dela, além de ajudar a enriquecer os grandes acionistas que eram seus donos, percebi e presenciei fatos interessantíssimos. Era enorme a diversidade de peões que trabalhavam nos diversos setores da fábrica. Homens, mulheres, do norte do país, do norte do Paraná, de lugares e cidades que eu nem imaginava que existiam. Todos ralando, e sonhando com uma vida melhor. Alguns reclamando, outros conformados, mas todos lá, dando seu suor e sua vida, em prol do trabalho.
Entre os funcionários muitos já tinham certa idade, trabalhavam ali há muitos anos. A rotina estafante e a vida ingrata haviam tirado desses homens a alegria e o prazer de viver. Eram carrancudos e desanimados. Só falavam de trabalho, só viviam para o trabalho. Mas essa realidade mudou, graças a um sujeito que respondia pelo apelido de “susto”. Era uma dessas figuras que poucas vezes encontramos. Louco, e sem juízo, susto era um cara conhecido por todos.
Aos poucos comecei a perceber uma mudança em um grupo de senhores. Alguns tinham comprado roupas novas, outros haviam pintado o cabelo e faziam a barba com certa frequência , e todos eles já não falavam somente de trabalho. Um dia ao entrar no vestiário para trocar de roupa e ir embora, vi um grande alvoroço, um dos senhores, desse grupo por mim observado, tinha derrubado um comprimido azul no chão do vestiário. Daí o motivo do grande alarde, o comprimido era Viagra! Vendido pelo susto por cerca de R$ 5,oo. O “tráfico” desse comprimido mágico já acontecia há algum tempo, dai o motivo de tanta transformação.
Foi inacreditável o que eu presenciei nos meses seguintes. Vi novos homens nascendo. Vi o viagra como um útero que gera o feto e o transforma até o momento de conhecer a nova vida. Vi no Susto, um profeta que trazia a boa nova a homens sem esperança. Descobri que um simples comprimido devolvera a sujeitos derrotados não só o alivio que se encontra no corpo feminino, mas a auto-estima a tanto tempo desaparecida. Muitas roupas novas foram compradas, muitos cabelos pintados. Muitos desses senhores reacenderam seu casamento. Outros arrumaram namoradas, alguns até mesmo amantes. A alegria antes esquecida pelos problemas da vida, agora fora despertada. E o comércio do comprimido era cada vez maior.
Deparei-me então com um fato extraordinário, toda a empresa havia sido afetada direta ou indiretamente pelo Viagra. Esse grupo de funcionários tinha contagiado e influenciado muitos outros trabalhadores. Entre estes, haviam chefes e líderes de setor, que também começaram a fazer uso do comprimido. A chama que o Viagra tinha acendido nos chefes refletia no dia a dia de trabalho. Eles tratavam melhor seus subalternos, que como consequência trabalhavam melhor e produziam mais. A diferença na produção foi tão notável, que até um churrasco foi ofertado pela empresa para gratificar os funcionários pelos bons resultados.
O quadro de funcionários da fábrica contava com duas psicólogas, que também tinham percebido a grande mudança. Porém elas atribuíam o aumento na produção à palestras de auto-ajuda, à frases de incentivo coladas nos corredores da empresa. Mal sabiam elas que toda aquela transformação não tinha sido feita pela psicologia do trabalho, empurrada garganta abaixo nos funcionários em terríveis sessões de auto-ajuda. Aquela enorme mudança havia sido trazida por um sujeito chamado Susto, e por um comprimido chamado Viagra, que tinha mostrado para aqueles homens que tudo é possível, inclusive voltar a viver.
por José Pires