sexta-feira, 15 de abril de 2011

Bagunça não, independência

idiossincrasia de Everton Mossato

Pela primeira vez moro “sozinho”. Longe dos meus pais e de meu país. Confesso que na minha casa, com meus pais, nunca dei muita atenção para tarefas do cotidiano doméstico. Como varrer o chão, lavar louça, lavar roupa, fazer comida, tomar banho (opa, tomar banho não, isso é igual em qualquer lugar) enfim, arrumar o quarto e esse tipo de coisa. Mas agora, morando sozinho aqui em Coruña a coisa mudou. Na verdade a ideia de ter que me virar com as coisas essenciais à vida social foi algo que contribuiu na decisão de sair de casa, e do Brasil, e fazer um intercâmbio. Em Curitiba as vezes ajudava com a louça, mas muito raramente e fazia comida as vezes, mas era mais quando queria comer algo específico, ou também pra ver se conseguia cozinhar algo que mais alguém fosse capaz de comer. Ano passado como ficava o dia todo fora de casa “não tinha tempo” de arrumar o quarto. Nem eu acreditei nessa, sempre tem tempo se a gente precisa fazer algo.
Diante da minha falta de tempo (tempo pode ser substituído por vontade) minha mãe fazia com gosto a gentileza de arrumar meu quarto. Minha querida namorada, Lady Day, também arrumava nosso ninho de amor com frequência. Pra ajudar eu tentava não jogar as roupas no chão, a cama recebia com carinho mochila, calças e qualquer outro produto têxtil que eu arremessava em sua direção.

Curiosamente em um momento, quando um dia sai de casa e o quarto estava virado num cativeiro, pensei: “quando voltar tenho que arrumar essa porra!”, sim eu pensei em exclamação. As jornadas laboral e acadêmica consumiram minha alma e ao final do dia devolveu minha carcaça ao meu lar. Abri a porta do meu quarto, acendi a luz, num mesmo movimento tirei o tênis - pressionando a ponta do pé direito no calcanhar esquerdo e vice versa, chutando o “pisante” em seguida para algum canto – e também tirei a mochila, com um movimento do ombro esquerdo deixando a gravidade exercer sua força e empurrar a mochila para baixo, deixando-a cair alguns centímetros, apanhando-a com a mão direita antes de tocar o chão e numa parábola visando o acúmulo de energia direcionei o objeto para minha cama, soltando-o assim que atingiu o fim da trajetória de impulso. Foi lindo, assim que a mochila bateu na cama as molas a empurraram para cima, depois de um duplo carpado ela caiu sobre o edredom e descansou finalmente. Ainda emocionado com o movimento percebi que a mochila estava sozinha em cima da cama. O que aconteceu? As calças e camisas se rebelaram e levitaram pelo ar até o guarda-roupa ou exalaram seu fétido cheiro até a maquina de lavar? Não sei, só sei que foi assim. O quarto todo estava arrumado, não havia mais meias pelo chão, as cortinas estavam presas por uma fita e não com um nó de marinheiro. O chão... dava pra ver o chão! E até um pequeno tapete esperava ser pisoteado por pés quentes pela manhã, protegendo assim do contato com o azulejo gelado. Era fato, minha mãe arrumou meu quarto de novo.

CAMA: na hora da pressa vira guarda-roupa
Agradeço infinitamente o que minha querida mãe (dona Izilda) e meu grande pai (seu beto) fazem por mim. Mas confesso que algo me incomodava nesta situação. É um pequeno ato, mas acabou direcionando minha reflexão para outro ponto. Talvez a consciência de que sou um homem de 25 anos e tenho o quarto arrumado pela mãe, ou pela namorada (menos mal, rss) me tirou da zona de conforto moral. E também me fez pensar que além disso era um homem de 25 anos morando com os pais, mas isso é outra história, um pouco mais complexa e em parte reflexo natural das relações econômicas e sociais contemporâneas. Mesmo assim via meu quarto como meu território, outorgado pelos senhores feudais do lar (meus pais) e que consequentemente deveria eu ter o domínio das ações realizadas nesta localidade. Verdade era que o desejo de deixar o quarto desarrumado ou manter certos móveis em certas posições fugiam ao meu poder. Mãe e namorada juntas conspiravam para me dar o melhor ambiente possível, minha atuação se limitava a viver feliz e tranquilo na redoma mantida pelas duas mulheres da minha vida .

Nos primeiros dias, quiçá diria nas duas primeiras semanas morando sozinho na península ibérica eu tentei manter o padrão de organização que dona Izilda aplicava à nossa casa em Curitiba. Tive sucesso nisso, mas algo estava estranho, por que tudo estava tão arrumado? Que objetivo tinha isso? E quantos minutos de sono por dia isso me tomava? Valia a pena tal esforço? Perguntas retóricas a parte o fato foi que ao longo dos dias arrumava cada vez menos minha habitação. Limpava a cozinha e banheiro seguindo o padrão da dona Izilda. Pois estas tarefas fazem parte do rodizio de limpeza do apartamento em que vivo aqui em Coruña, e também é fundamental para o bom convívio entre nós, moradores deste piso compartido. Como um pássaro o tempo voa, os dias passam e a bagunça se acumula. Perdão Mãe, perdão Day, mas agora pra mim bagunça é sinônimo de liberdade e independência. 


Roupas esperam pacientemente o passeio à máquina de lavar

Depois eu arrumo... depois nunca chega.

A poeira incomoda um pouco, mas acho quase tudo que preciso, 
infelizmente não preciso de tudo que acho.


Como diria Charlie Harper:
 "Não sou inútil, posso servir de mal exemplo"

4 comentários:

  1. Bagunça da uma sensação boa, quando arrumo minhas coisas eu sinto isso, mas nem tudo fica no lugar, acredito que ela seja necessária para criação, fruição, nada está pronto, é um processo contínuo de construção e descontrução, formação... esse é o "T" da coisa... sem subordinação, a organização é necessária, mas alguém já disse "alguma coisa está fora fora da ordem"... por ai vai agora eu tenho estagiária ela chegou fui... to mandando.

    ResponderExcluir
  2. Vc é meio bagunceiro e o resto sao filosofias....
    Arruma o seu quarto anda...

    ResponderExcluir
  3. hahaha, verdade, sou bagunceiro mesmo, quando arrumar tiro uma foto pra provar que arrumei.

    pô marinho, qual que é dessa estagiária, não venha me dizer que é trabalho... em órgão público, nunca vi... heheh
    um abraço mano, saudades!

    ResponderExcluir
  4. KKKKKKKK!!!! O bebe deixou a creche!!!!!

    ResponderExcluir